quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Agora sendo franco

Realmente gostei da aparência disto aqui. A total falta de significado do camaleão se encaixa perfeitamente na minha falta de planos. Gostei tanto que começo a achar desnecessário me esmerar muito no texto. Pra quê? Eu mesmo tenho entrado aqui, olhado a página com um largo sorriso de prazer, papando-léguas entre as letrinhas, lançando uma expressão de pensador à simpática interrogação... fecho a página e abro de novo, pra ver se ainda está lá. Olhem, e está! Ainda que eu seja incapaz de sair na rua sem arrancar uma gozação ao menos em relação à inusitada combinação de cores das minhas roupas (camisa azul-celeste, bermuda verde-radioativo, mochila vermelho-sangue...), achei que as datas ficaram perfeitamente harmonizadas - esse laranja até deveria se chamar laranja-parnasiano!

- Convenci?
- Não, você exagerou no elogio. Fosse mais discreto e todos iríamos concordar que ficou legal. Dessa forma parece até que está sendo irônico.

É verdade... pra ser sincero, só consigo ver como isso foi feito, e não como ficou. Olho pro título e vejo os contornos quadrados, ainda que estejam indistinguíveis devido ao negrume em volta - sei que assim foi feito justamente para enganar a visão e dar a impressão dum verde 'pincelado'.

Claro que vocês sabiam disso, mas possivelmente só vieram a pensar tal efeito agora que eu disse. Interessante, não? Afinal o texto que escrevo agora é tão enganador quanto cada efeito visual do seu computador ou da tv. Não ganho nada contando verdades a ninguém aqui, não tenciono fazer isso e muito menos vocês o querem.

- Ou você REALMENTE achou ter eu gostado da expressão 'laranja parnasiano'?
- Err, bem...

Quem escreve mente, tenha certeza disso. Um pilantra, ainda que, as vezes, bem intencionado. Quando coloquei a crítica ao elogio exagerado, vocês possivelmente absorveram primeiro como uma linha do meu texto, depois, era indistinto do seu pensamento...

- Como posso saber se não está mentindo sobre isso também?

Não sabe. Mesmo porque, se soubesse, já estaria tão entediado que teria me mandado às favas. E é bem capaz que termine o texto achando que eu inventei toda essa história, 'menti estar mentindo'...

Ainda bem. Volte sempre.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Wouldn't it be nice

Sento.

Por ora, meu nome é Robinson e estou perdido numa ilha, mas vou sobrevivendo: montei minha cabana, de comer aqui não falta, dei meu jeito de lidar com os canibais, mas não vejo a hora de voltar pra casa.

Canso, desvio os olhos do papel e miro uma coisa mais luminosa. E barulhenta. Eu e cinco amigos muito próximos, morando num mesmo prédio, a vida é uma brincadeira com intervalos pra discussões absurdas e comercial. Noutro momento, me sinto forte e só, em território inimigo, esta faca é tudo em que confio. Tiros, corro... corro... e aquela música começa, olho pra trás, as crianças me seguem, estou quase chegando - já vejo a praça, subo os degraus aos saltos, consegui! Consegui e estou todo suado por causa do esforço, mas valeu a pena: é uma morena e tanto! Agora aquele beijo com direito a cenário paradisíaco e tudo vai escurecendo...

Desligo a tv assim que os créditos reclamam seu espaço. Volto a ser o sujeito mirrado e nada heróico da vida real. Silêncio e angústia pesam feito minhas pernas no sofá. Porém há algo pior do que 'viver' o que não se pode ser - lembrar o que poderia ter sido...

E se...?

sábado, 22 de novembro de 2008

Olvidada

Deixando os especialistas e seu papo científico de lado, a memória é composta por algo muito mais sofisticado que meras lembranças aleatórias - há toda uma seleção que revela nossa capacidade associativa e atribuidora de afeto. Acontece que algumas vezes tenho a impressão de que algum processo extraordinário alterou essas seleção, eliminando indevidamente certos dados ameaçadores.

Penso isso ao olhar para meu celular. Quedê que lembro de como era minha vida sem ele? É como se tivesse me acompanhado por toda uma vida, sorrateiro, com seu display a me jogar na cara as horas. Sou capaz de ouvir seu toque misturado aos meus desenhos prediletos de quando tinha oito anos, sentir o vibrar silencioso no meu bolso, interrompendo meu momento a sós com minha primeira garota, ou mesmo não duvidar caso alguém relate meu nascimento dando especial atenção ao modelo prateado pré-pago que veio de brinde, embutido na placenta de mamãe.
- Doutor, então, meu filho é...?
- Não é claro ainda. Está vivo, pelo menos.
- Graças a Deus!

Meus duvidosos momentos sem este aparelho foram, sem dúvida, eliminados da minha memória por alguma radiação estranha ou pacote promocional aceito inadvertidamente. E creio que alteraram meu senso de afeto também, atribuindo certo apreço à sutileza das mensagens de texto.

Pois é. Faço parte de uma raça que faz simbiose com esses acessórios: entra no banho de óculos, reclama da sunga ou bermuda que não tem bolso para carregar os tais objetos indispensáveis, e cujo coração bate mais forte de curiosidade ao escutar o apitar de mensagem recebida, principalmente quando já está à espera de alguma resposta. Aí surge a decepção: propaganda da operadora. Quantos suspiros decepcionados ante a desagradável descoberta das frases já tão conhecidas e nada sedutoras que tentam convencê-lo de que O Lance do momento é responder perguntas irrelevantes sobre aquele seriado bombástico que você nunca teve o desprazer de assistir.

Agora está tocando. Número desconhecido a cobrar.
- Nós raptamos seu filho, deposite agor...
- Esse tipo de assunto você discute com minha esposa. Eu só pago as contas no fim do mês.
Desligo. O fato de eu não ter filhos nem esposa talvez complique um pouco o golpe do malandro. Me pego pensando que, se há um equilíbrio entre bem e mal no mundo, teriam inventado o celular para contrabalancear os anjos da guarda ou vice-versa. Seja como for, ele ainda está aqui. Ainda. Ainda bem?

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Coliseu

Papel, caneta, corretivo, lápis, borracha, apontador, durex. Janela aberta, cortina fechada, livros e almofadas em seus devidos lugares, mesa limpa exaustivamente com álcool, despojada de enfeites. Reina o silêncio - tudo pronto.

Ele posiciona seu equipamento num estojo, fixa com durex o papel na mesa, puxa a cadeira para sentar, acende a luminária que, em sua armação de haste flexível com cabeça em globo, mais parece um olho a observar o quer que lhe ordenem observar.

Tudo pronto. Olha para o papel, caneta em riste, coça a cabeça, solta a caneta. Estica as costas, estala os dedos, olha o papel, suspira. Ergue novamente a caneta: agora é só começar.

O vazio da folha espera com um olhar de desdém enquanto seu algoz reúne coragem para desenhar a primeira letra. Este balança a cabeça numa expressão agoniada, maldito relógio, levanta e vai à cozinha, deve ser fome. Volta , senta, morde os lábios, o telefone toca. Quando? Hoje às oito? Certo, vou sim.Tá, tá, eu trago.

Desiste, recolhe o estojo, recoloca os retratos,mas deixa o papel ali, preso, soubesse desenhar faria o sorriso debochado que ali sente...

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Apresentação

Escrever sem objetivo não deixa de ser uma falha, ou o reconhecimento de uma - normalmente insatisfação ou mera confusão. Há de ser também simples engodo, argumentação mercenária a favor do tema que vier aos olhos e à cabeça, na esperança de que quem leia sinta uma faísca qualquer de identificação com o frágil castelo de palavras nem sempre cuidadosamente encaixado pelo autor.

Dia desses li numa crônica do Fernando Sabino que artista é aquele capaz de tornar interessante um fato a princípio insignificante, assim como trazer à tona as sensações mais sutis, sendo necessário ao amador recorrer às suas experiências pessoais mais dramáticas para alcançar um mínimo de comoção. Por enquanto, concordo com a idéia, mas não posso garantir que vá conseguir algo parecido, não que me sinta desesperado por isso.

Seja como for, vejo necessidade de pensar um motivo para isto aqui e creio ter encontrado uma direção num daqueles momentos em que fins e resultados estão em menor prioridade possível: as longas, inconclusas e divertidas conversas 'de bar' cujas metas e desenvolvimentos são um caos quase completo, não fossem as discretas (as vezes flexíveis) regras informais desses colóquios que, no fim das contas, podem ser resumidas a uma só: todos podem 'achar' algo, mesmo que tenha de ser em voz baixa, pra ninguém ouvir.

Eis minha pretensão: um achismo despreocupado, sem o menor embasamento teórico ou aspiração revolucionária, longe de ser literatura e nem, que todas as crenças humanas não o permitam, um relatório insoso do que fiz durante o maldito dia em que estiver escrevendo.

- Luís, a aparência dessa página... você não podia fazer algo um pouco mais sofisticado?
- Não. E se a preguiça e falta de intimidade com tal atividade não te servirem de justificativa, dou outra: esse negrume todo, admita, passa um certo vazio, não? Daqueles que ajuda a nos concentrar, principalmente se esse vazio já estiver 'meio' instalado no leitor antes mesmo de ter sentado ao computador. Além do mais, cansa menos a vista.

- Luís, você sabe que eu, enquanto cidadão educado, não irei expressar que achei seu texto uma merda, direi apenas que 'não concordo com tudo', ou 'sei lá'. Tem também a genial saída: ficar calado. Espero que compreenda.
- Vamos só colocar uma regra em todo esse achismo: colocar o porquê das opiniões. Me parece sensato. E se é pra ficar calado, mesmo tendo comentários a fazer... que faz aqui? Você certamente prefere assistir tv a conversar.

- Luís, esse texto já não tá meio grande não?
- Talvez sim, prum blog bobo. Paremos por aqui, amanhã a gente conversa.