Um dia ela acorda e descobre que não há um 'ontem'. Olha ao redor e nota ser a cama de verniz escuro sobre a qual está deitada tão pouco familiar quanto o armário mal fechado ou mesmo suas próprias mãos. Emerge das cobertas que a envolvem, anda até a janela e a abre, como se fosse uma arca antiga onde estivesse guardado O Segredo, apenas à espera de alguém corajoso o suficiente para revelá-lo. Sente o vento frio beijar-lhe os seios e nota, pela primeira vez, sua nudez. Junto à consciência, lembra da vergonha e num impulso fecha a janela, olho do mundo - há desconhecido o bastante para se explorar aqui dentro.
Investigando o armário, encontra um espelho embutido em uma das portas e diversas peças de roupa, quase idênticas, não fossem as sutis variações nos símbolos inteligíveis - uma espécie de escrita? - que as adornam. Evita seu reflexo antes de estar completamente vestida, a desagradável surpresa na janela ainda está martelando sua cabeça - houvesse observado a si antes do mundo talvez descobrisse mais de ambos, agora evita um por ter recuado diante do outro. Quando finalmente coberta e protegida, reúne coragem e encara seus olhos. Não consegue, não havia percebido o quão embaçado estava o espelho. Limpo, a revela e permite à sua dona um longo e pasmado mirar, um alisar de cabelo e de rosto, um baixar de nariz perante à confusão.
A porta de saída do quarto está trancada apenas por dentro e os sapatos dela ganham a sala: vazia como sua memória. Mesa, cadeiras e estante, despojadas de uso, intensificam a ausência; de enfeites, teias de aranha; de perfume, a poeira. O resto da casa acompanha: tudo numa meticulosa generalidade, nada de livros ou retratos, resquício sequer de passado - um eterno 'hoje' mofado.
Continua...
Investigando o armário, encontra um espelho embutido em uma das portas e diversas peças de roupa, quase idênticas, não fossem as sutis variações nos símbolos inteligíveis - uma espécie de escrita? - que as adornam. Evita seu reflexo antes de estar completamente vestida, a desagradável surpresa na janela ainda está martelando sua cabeça - houvesse observado a si antes do mundo talvez descobrisse mais de ambos, agora evita um por ter recuado diante do outro. Quando finalmente coberta e protegida, reúne coragem e encara seus olhos. Não consegue, não havia percebido o quão embaçado estava o espelho. Limpo, a revela e permite à sua dona um longo e pasmado mirar, um alisar de cabelo e de rosto, um baixar de nariz perante à confusão.
A porta de saída do quarto está trancada apenas por dentro e os sapatos dela ganham a sala: vazia como sua memória. Mesa, cadeiras e estante, despojadas de uso, intensificam a ausência; de enfeites, teias de aranha; de perfume, a poeira. O resto da casa acompanha: tudo numa meticulosa generalidade, nada de livros ou retratos, resquício sequer de passado - um eterno 'hoje' mofado.
Continua...
Hm... Sinto que, em uma esquecida tarde de segunda ou terça-feira, vi essa mesma coisa acontecer comigo.
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